Sentia saudade. Saudade dos alegres tempos passados. Da
minha amada que partiu, do meu filho e netos que estão longe.
Nos velhos tempos sentia que tinha um mundo sobre as minhas
costas. Tinha a minha família para cuidar e trabalhava imenso a fazer peças de
artesanato. Os turistas compravam tudo aquilo que eu fazia. Então eu fazia
centenas, não milhares, de peças por semana. Garantia que havia sempre comida
em casa e o meu filho conseguiu estudar.
Os turistas ainda compram tudo o que faço. A vontade e a
necessidade de trabalhar é que são menores. Um dia, de manhã, mais por capricho de
um velho do que por necessidade de vender, resolvi fazer uma coisa diferente: um
pequeno mundo sobre uma pequena mão.
Após acabar a peça, coloquei-a numa prateleira e abri a
loja. Estava um lindo dia de Sol. Os turistas entravam e saiam. Alguns iam
apressados, outros demoravam algum tempo. Alguns não compravam nada, outros compravam
imensas peças. Alguns eram simpáticos, outros ignoravam-me por completo e ainda
havia quem me olhasse com desprezo, como se o que compram não fosse algo
nascido do meu trabalho e da minha criatividade. No fundo, da minha história.
Ao fim de um dia que parecia ser igual a tantos outros,
quando estava a preparar-me para fechar a loja, entrou uma jovem. Vestia roupa
de praia e aparentava ser só mais uma universitária a aproveitar as férias.
- Boa tarde – cumprimentou a rapariga.
Reparei no seu aspeto. Bastante parecida com a minha amada
quando a conheci. Tinha a mesma vivacidade capaz de encher qualquer espaço com
alegria.
A rapariga, sempre a sorrir observou todas as peças que
tinha a loja. Surpreendi-me quando ela pegou na peça que tinha feito nessa manhã, pergunta-me:
- Qual é a história desta mão?
- História? É só uma peça... Não tem história nenhuma – respondo.
- Tudo tem uma história. Nem que seja a forma como a fez.
Fiquei surpreendido por a jovem reconhecer meu trabalho,
então resolvi inventar uma pequena história, como as que contava ao meu filho
quando era pequeno.
- Num local muito distante, um gigante vivia sozinho. Todos
os dias chorava por se sentir só. Embora estivesse sempre à procura de outros
gigantes, não tinha esperança de algum dia encontrar alguém. Apesar de ser um
gigante, sentia-se pequeno. Um dia, ao limpar as lagrimas, reparou que tinha
algo na palma da mão, era um pequeno mundo que vivia sobre ele. Um mundo que
necessitava dele para existir.
- O que aconteceu ao gigante? – perguntou a jovem com uma
curiosidade demasiado infantil para a sua idade.
- O gigante continuou sem encontrar nenhum outro gigante.
Mas sempre que chorava, lembrava-se que tinha um pequeno mundo que precisavam
dele – respondi.
- É uma excelente história – a rapariga exibiu o seu
fantástico sorriso. – Quanto custa a peça?
- Nada. É um presente para si. Desde que prometa contar esta
história a quem lhe perguntar a origem desta peça.
- Muito obrigada. Prometo! – A expressão da rapariga
convenceu-me que deve existir milhares de pessoas a querer saber uma história
destas.
Nessa noite chorei. Depois sorri, ao lembrar-me de uma
jovem, que me fez lembrar que sou importante neste mundo.